Estabelecer uma cultura corporativa e mantê-la é um desafio para as áreas de recursos humanos das empresas. O trabalho é ainda mais árduo quando as companhias passam por um processo de fusão ou aquisição.
Para se ter uma ideia da importância do tema, em uma pesquisa realizada pela consultoria Bain com executivos que passaram por fusões o choque cultural foi o motivo número 1 para o fracasso de um negócio de M&A em atingir o valor esperado. Segundo o relatório da consultoria, “em um choque cultural, as formas fundamentais de trabalhar das empresas são tão diferentes e tão facilmente mal interpretadas que as pessoas se sentem frustradas e ansiosas, levando à desmoralização e deserções”.
Nesses casos, a produtividade dá sinais de que as coisas não vão bem, mas nem sempre os gestores olham com atenção para esse ponto ou então não sabem como corrigir o problema.
Cultura corporativa não costuma ser uma prioridade
Não raramente, os executivos envolvidos em um processo de fusão ou aquisição têm ferramentas bem desenvolvidos para gerenciar os aspectos financeiros e operacionais do negócio, acompanhando os resultados de perto e responsabilizando os executivos por atingirem suas metas no prazo. Por outro lado, integrar duas culturas díspares, diz a Bain, é algo “difícil de medir e quase impossível de gerenciar diretamente. Como resultado, poucas organizações aplicam o mesmo rigor para gerenciar e orientar a integração cultural”.
Em um artigo recente, Mariana Dias, sócia-fundadora da plataforma de recrutamento Gupy, afirmou que é papel de gestores e líderes defender o entendimento de que as duas empresas têm, depois da fusão ou aquisição, a mesma identidade e os mesmos objetivos, estimulando as equipes a compreenderem o novo cenário.
“Uma nova cultura organizacional acaba se instaurando naturalmente e, em muitos casos, deve ser realizado um trabalho de mudança do mindset sobre a forma de atuação dali para frente, o que deve começar pela gestão para alcançar os demais profissionais da empresa”, diz Dias.
Um dos grandes desafios em relação à gestão de pessoas pós M&A é que o negócio pode gerar, nos funcionários, um receio sobre quais serão as diretrizes e regras a partir daquele momento. Por isso, a comunicação clara e assertiva é essencial. “A empresa deve posicionar-se de forma clara e transparente sobre os objetivos, as perspectivas e as expectativas gerados pelo processo de fusão e aquisição de outra empresa — é possível transmitir para as equipes uma mensagem de otimismo e motivação, com foco nas oportunidades de aprendizado e crescimento profissional”, escreveu Dias.
Como realizar a integração cultural após o M&A
Como cada empresa envolvida na negociação tem seus próprios costumes, políticas, ideologias e modo de trabalho, o risco de confrontos existe e o alinhamento cultural é extremamente necessário desde o início.
A Bain dá uma lista de boas práticas para que a integração cultural seja bem-sucedida após uma fusão ou aquisição.
Estabelecer a agenda da integração cultural
Vale lembrar que a cultura de uma empresa inclui valores, crenças e comportamentos compartilhados que determinam como as pessoas fazem as coisas em uma organização. Para integrar duas culturas, portanto, é preciso, primeiro, definir o objetivo cultural em termos mais amplos, o que requer envolvimento do topo da organização, incluindo o CEO. Esse escopo precisa deixar claro qual cultura vai emergir a partir da combinação das duas empresas.
Fazer um diagnóstico das diferenças relevantes
Em muitos casos de M&A há diferenças significativas na cultura das duas empresas envolvidas. Um diagnóstico pode identificar e medir as diferenças entre pessoas, unidades de negócios, regiões geográficas e funções. Esse mapeamento vai ajudar a determinar como as lacunas serão fechadas.
Definir a cultura que se quer construir
Depois de ter a agenda definida e o diagnóstico feito, é hora de partir para a ação. A liderança da companhia terá, então, dois trabalhos a fazer. Um é determinar quais são as lacunas críticas a serem fechadas e o segundo é estabelecer uma fotografia detalhada da futura cultura. Essa fotografia vai além de valores e visão da empresa, e precisa ser concreta o suficiente para ser executada no dia a dia pelos gestores. Por isso, essa fotografia precisa trazer ações e comportamentos específicos detalhadamente.
Para criar essa nova cultura, os workshops podem ser bastante úteis. Neles, as pessoas da empresa se reúnem para construir uma visão de como se comportarão coletivamente e o que alcançarão com esse comportamento. Um exemplo prático: o novo chefe de vendas da empresa combinada e os gerentes regionais participaram de passeios com representantes de vendas de ambas as organizações, observando como os vendedores interagiam e como tomavam decisões em tempo real no campo. A partir daí, coletaram dados. Nos workshops é possível ajudar os gerentes de vendas a nomear os conjuntos específicos de comportamentos que desejam ver no futuro, juntamente com os processos e incentivos que incentivarão esses comportamentos.
A integração da cultura corporativa não pode esperar, e deve estar na prioridade de um negócio de M&A.